Ironicamente, Gustavo Negreiros é duplamente meu colega. Assim como ele, tenho um blog. Assim como ele, sou advogado.

Mas as semelhanças param por aí, já que, mesmo sendo jornalista, Gustavo pratica o anti-jornalismo e, mesmo sendo advogado, postula a favor do anti-direito.

Veja a notícia publicada por ele hoje, 11, na qual acusa a Secretária Estadual de Educação, Socorro Batista, de acumular indevidamente os vencimentos de professora aposentada da UERN, professora ativa da UFERSA (cedida ao Estado do RN) e Secretária Estadual.

Exponho, inicialmente, as disposições jurídicas pertinentes ao tema.

Em seu art. 37, inciso VI, a CF estabelece como regra a impossibilidade de cumulação de cargos públicos, especificando, porém, na alínea “a”, como uma das exceções, a cumulação de dois cargos de professor(a).

Nos termos do art. 37, § 10, da CF, é vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma da Constituição, os cargos eletivos e os CARGOS EM COMISSÃO.

Nos termos do art. 39, § 4º, da CF, Secretários Estaduais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória.

Passemos à análise do caso.

A professora Socorro recebe atualmente proventos de aposentadoria como professora da UERN, salário de professora da UFERSA (cedida ao Estado do RN) e gratificação de representação pelo exercício de Secretária Estadual.

A cumulação É LÍCITA. Explico.

A cumulação dos proventos de aposentadoria com o salário de professora da UFERSA está autorizada pelo art. 37, § 10, da CF.

Caso não fosse professora da UFERSA, igualmente poderia cumular os referidos proventos com o subsídio que receberia como Secretária Estadual, também com fulcro no art. 37, § 10, da Constituição.

Isso porque, embora a doutrina faça a distinção entre cargo político (como o de Secretário Estadual) e cargo em comissão (chefia, direção assessoramento), ao apreciar a questão de qual teto remuneratório se aplica às cumulações permitidas pela Constituição, o STF entendeu como CUMULÁVEIS os proventos de aposentadoria de uma desembargadora com o SUBSÍDIO por ela recebido como Secretária:

AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MAGISTRADA APOSENTADA QUE EXERCEU CARGOS COMISSIONADOS. ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA E SUBSÍDIO DE CARGO EM COMISSÃO. POSSIBILIDADE. TEMAS 377 E 384 DA REPERCUSSÃO GERAL.
(STF – AgR RE: 1264644 SE – SERGIPE 0803269-19.2018.4.05.8500, Relator: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 29/06/2020, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-176 14-07-2020)

Detalhe importante é que, se ela recebia subsídio, o cargo de Secretária possuía natureza POLÍTICA (art. 39, § 4º, da CF), mas o STF chamou-o apenas de cargo EM COMISSÃO, a fim de permitir a cumulação com os proventos de aposentadoria como desembargadora, já que o art. 37, § 10, da CF, excepciona apenas o cargo em comissão, não o político.

Como consequência, deve-se compreender que o CARGO EM COMISSÃO é um gênero, do qual fazem parte tanto aquele que possui natureza administrativa (direção, chefia, assessoramento), quanto o que possui natureza política (Secretário de Estado, p.e.).

O mesmo entendimento é o exposto pela Lei Complementar Estadual 122/94, art. 2º, § 1º, alínea “d”, que classifica o cargo em comissão apenas como aquele que é de “livre nomeação e exoneração”. Ora, o cargo de Secretário Estadual de Educação é de livre nomeação e exoneração, sendo, portanto, um cargo em comissão!

Logo, conjugando-se o entendimento do STF com as disposições da LCE 122/94, deve-se entender que o cargo de Secretária Estadual de Educação é um cargo em comissão remunerado por subsídio, ante a sua natureza política.

Contudo, além de professora aposentada da UERN e Secretária, Socorro é professora da UFERSA (ativa e cedida ao Estado).

Logo, pode-se alegar que ela não poderia receber a gratificação de representação, já que, sendo Secretária, deve receber subsídio, em relação ao qual é vedado o pagamento de gratificação, nos termos do art. 39, § 4º, da CF.

ATENTAI BEM: abaixo o raciocínio jurídico que, se for analisado com um mínimo de boa-fé por Gustavo, ele pede desculpas pela MENTIRA.

Ocorre que a professora Socorro não recebe subsídio cumulado com gratificação! Ela optou por receber o salário de professora da UFERSA com a gratificação de representação prevista no art. 47, inciso IV, alínea “a” c/c art. 47, parágrafo único, inciso II, todos da LCE 122/94. E a concessão da gratificação é lícita já que, embora o cargo de Secretária possua natureza política, é cargo em comissão.

Logo, a cumulação dos proventos de aposentadoria com o cargo de professora da UFERSA está respaldada no art. 37, § 10, da CF, ao passo que o recebimento da gratificação de representação está fundamentada nas disposições da LCE 122/94 e no entendimento do STF acima mencionado.

Como consequência, não há que falar nem em cumulação indevida, nem em ofensa ao sistema de remuneração por subsídio.

FIM DA FARSA.

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