Hoje compareci à Assembleia Legislativa para tratar de uma demanda ultra-secreta de repercussões estaduais.
Feliz ou infelizmente, não é mais tão fácil passar despercebido.
Na Assembleia, fui destinatário de olhares dos mais diversos: sorrisos sinceros e forçados, expressões de desconfiança, desdém e até raiva velada.
Nada que não fosse esperado, mas, então, veio o corredor seguinte.
À frente e à esquerda, um senhor que eu não conheço sorri e grita: “olha a Raposinha, o melhor blogueiro do Rio Grande do Norte”.
Ando até ele, em sentido diagonal, aperto-lhe a mão. Encerrado o cumprimento, ainda sorrindo, o homem gesticula com os olhos em direção a outro, que estava à minha direita.
De costas, o homem à direita era alto e olhava para o celular, anti-harmonicamente de frente para a parede.
Não entendi. Não o conhecia. Tento identificá-lo pelas laterais do rosto. Não consigo.
Apelo para as microexpressões faciais, e elas atestam ansiedade, tensão, constrangimento, sinais de uma alma conturbada. “Ele é como eu. Quem é? Não pode ser! Aqui e agora? Que resenha!”.
O homem de costas era Gustavo Destemperado Negreiros, mais alto do que eu imaginei que fosse.
Uma senhora o reconhece, ele a cumprimenta, novamente de modo anti-harmônico, anti-natural.
Silêncio constrangedor: era por minha causa. O homem sorridente que me chamou havia falado alto de propósito. Por isso Gustavo encontrava-se (anti-harmonicamente) em silêncio, de frente para a parede, de costas para todos.
Não me alegrei. Pelo contrário, entristeci—me.
Todos que conheço falam mal dele, ninguém nunca falou bem. Mas ninguém pode ser tão ruim assim. Provavelmente os políticos de direita falam o mesmo de mim.
Embora eu não o tenha feito, desejei cumprimentá-lo.
Primeiro, porque não tenho inimigos.
Segundo, em razão da empatia, advinda de uma alma similarmente conturbada.
Terceiro, em agradecimento.
Sim, foi ele quem mais fertilizou o terreno para que o Raposismo florescesse, tornando necessário o surgimento de alguém para bater de dentre, com armas similares, porém mais afiadas.
Por isso eu queria agradecê-lo.
Afinal, o Batman não seria o mesmo sem o Coringa.