Do DCM- Municípios onde o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teve mais votos nas eleições presidenciais de 2018 e 2022 tiveram mais mortes durante os picos da pandemia de Covid-19 no Brasil. As informações foram divulgadas em um estudo publicado na revista Cadernos de Saúde Pública nesta segunda-feira (20).
A pesquisa analisou a relação entre o excesso de mortalidade registrado em 2020 e 2021 e o percentual de votos obtido por Bolsonaro no primeiro turno desses pleitos.
Na crise sanitária, o ex-chefe de estado brasileiro contrariou as recomendações de autoridades de saúde e se opôs a medidas de isolamento social e uso de máscaras. O trabalho identificou que cada aumento de 1% nos votos municipais para Bolsonaro em 2018 e 2022 esteve associado a uma alta de 0,48% a 0,64%, respectivamente, no excesso de mortes dos municípios durante os picos da pandemia.
“Houve uma fidelidade enorme no eleitorado. Um núcleo de eleitores continuou a votar nele. A expectativa era que ele seria penalizado eleitoralmente, que a rejeição aumentasse. Isso não ocorreu”, explica Everton Lima, docente e pesquisador da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Lima, um dos autores do estudo, disse que a pesquisa mostra uma associação entre um maior excesso de mortes e mais votos em Bolsonaro, não uma relação de causa e efeito.
Segundo o pesquisador, não é possível dizer que as pessoas que se opunham ao uso de máscaras e ao isolamento social votaram em Bolsonaro porque ele empunhava essas bandeiras. Tampouco concluir que elas se identificavam com o então mandatário e, por isso, adotaram esses comportamentos. Já a descrença nos impactos da pandemia, a resistência ao uso de máscaras e a demora na implementação de uma campanha de imunização podem explicar essa associação, apontou o trabalho.
Mesmo assim, os dados podem refletir, por exemplo, medidas de saúde inadequadas implementadas por governos municipais onde Bolsonaro obteve mais votos.
Jair Bolsonaro segura uma caixa de cloroquina do lado de fora do Palácio da Alvorada.
Vale destacar que o estudo teve colaboração ainda de Lilia da Costa, da UFBA (Universidade Federal da Bahia), Rafael Souza, Cleiton Rocha e Maria Ichihara, todos da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
Voto ideológico
Os autores utilizaram os resultados do primeiro turno das eleições para capturar melhor o voto ideológico. O excesso de mortalidade compara a média mensal de mortes entre 2015 e 2019 com o número de mortes durante os picos da pandemia.
“É um termômetro para dizer que está acontecendo algo diferente”. De acordo com a pesquisa, a oposição a Bolsonaro, representada pelos votos no PT, mostrou uma correlação negativa com o excesso de mortalidade nos municípios, ou seja, quanto maior o percentual de votos verificado nos candidatos petistas, menor foi o número de mortes.
“Há uma fidelidade até certo ponto cega”, diz Lima. “Estamos polarizados em um nível político que é o nós contra eles. Você acaba sendo alimentado por informações de dentro do seu grupo. Não conversa com o outro lado.”