Por Francisco Gaspar de Lima Júnior*
O desenvolvimento, entendido como uma categoria, varia o próprio sentido que assume, conforme o tipo de discussão acadêmica em que ele se encontra. Isto porque, no campo da ciência consitucional, da economia e da administração pública, o desenvolvimento se relaciona ( e demanda) instrumentos específicos conforme seus objetivos. A saber como política de Estado, “desenvolver-se” significa demandar de políticas públicas garantidoras de direitos sociais, como saúde, educação, moradia, alimentação adequada e outros.
Ainda, o artigo 170, I, da Constituição Federal de 1988, assevera que a soberania econômica nacional será viabilizada pelo desenvolvimento nacional (artigo 3º, II, CF), para superação da condição de subdesenvolvimento, ao tempo em que o artigo 219 da mesma carta constitucional prenuncia a integração do mercado interno ao patrimônio nacional, como consequência dessa soberania.
É o que se vê no âmago destas discussões sobre a superação do subdesenvolvimenbto desde os países capitalistas nucleares, nos anos oitenta, no contexto da crise da dívida pública, quando houve a reconfiguração das políticas desenvolvimentistas de matrizes keynesianas por esquemas neoliberais, em novo processo de financeirização da economia, que desarticulou o chamado Welfare State do pós-segunda guerra e impôs a receita da austeridade, mediante ajustes que geralmente se expressam através de redução salarial e de cortes orçamentários controladores dos preços e gastos públicos.
A referida austeridade, tende a incutir uma tensão contraditória que institue políticas de austeridade, com controle das finanças e da gestão públicas, enquanto, por outro lado, a superação do subdesenvolvimento demandaria medidas securitárias dos direitos sociais e de indução do desenvolvimento.
Nesse percurso, a realidade brasileira marcada por profunda desigualdade social, é penalizada com menos estruturas garantidoras de direitos, atingindo pesadamente setores como saúde, trabalho e educação.
De modo específico, no tocante à educação pública, e nestas as Universidades Federais, cabe mencionar o impacto do congelamento vintenário de gastos da União, decorrentes da EC 95/2016, sobre as Universidades Federais. Atentando-nos aos alertas de que “a conta não vai fechar”, vez que no último ano antes da pandemia, em 2019, o orçamento foi de R$ 6,1 bilhões para 69 universidades federais. Em 2020, caiu para R$ 5,5 bilhões e, em 2021, teve uma queda brusca para R$ 4,5 bilhões.
Urge-nos pensar sobre as reduções que levaram a manutenção das atividades universitárias de meio e de fim a níveis críticos, ao tempo em que atentam contra o direito social à educação, instrumental à ordem jurídica constitucional desenvolvimentista do país. De modo que, diante dos cortes de recursos e do regime orçamentário e da falta de instrumento normativo apto a obstruir medidas inconstitucionais, O Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica (art. 174 da CF), poderia prescindir da congruência com a ideologia constitucional desenvolvimentista, motivado por parâmetros de austeridade impostos por cada governante de plantão? Dito de outro modo, o governante e os congressistas estarão, em virtude da votação popular, autorizados a mutilar o texto constitucional, no caso dos direitos sociais, sem que nem o STF possa atuar, com base na sistemática constitucional vigente, para anteparar o desfecho nocivo sobre os direitos? No caso das Universidades Federais, não poderiam estas, consubstanciadas na autonomia universitária, evitar congelamentos e cortes que afetem a manutenção de um patamar orçamentário mínimo?
Fato é que as políticas econômicas governamentais, que desconsideram os complementares fatores sociais, como saúde e educação, em nome de parâmetros de austeridade não testados, caso impactem o funcionamento de órgãos públicos e autarquias ao ponto de desconsiderarem o direito fundamental de base que dá vida e sustentação, não poderiam ser validadas cabendo contestação. É este o caso, o orçamento e custeio das universidades federais brasileiras foi alterado de maneira tal que chega a desconsiderar a manutenção da efetividade do direito de acesso ao ensino superior, como obrigação constitucional indispensável.
*Francisco Gaspar de Lima Júnior é mestre em Direito Constitucional pela UFRN. Professor Universitário. Servidor da UFPI.