Por Ana Maria, coordenadora geral do SINSENAT

É comum ouvirmos em conversas informais que nada diferencia o homicídio comum do feminicídio. Nada mais falso que afirmar isso. E é a falsidade dessa simplificação que quero demonstrar hoje.

O feminicídio possui sua própria e cruel realidade. São os contextos de desigualdade de gêneros que vitimizam milhões de mulheres no Brasil. Nós somos vítimas da violência doméstica, tanto física quanto psicológica. Somos vítimas também da violência do silêncio que envolve a agressão contra mulheres.

Em 2021, no Brasil, foram registrados um estupro a cada dez minutos e um feminicídio a cada sete horas. Não são apenas estatísticas. São tragédias que se sucedem com a conivência da sociedade. São vidas e famílias destruídas. É sangue manchando cotidianamente a história de nosso país. Isso precisa acabar.

Ao negarem a triste realidade do feminicídio no Brasil, aqueles dizem não haver nada de especial nesse tipo de crime estão empurrando para debaixo do tapete as condições de vida das mulheres brasileiras. Bem como nosso lamentável legado de violência patriarcal.

Dentre as principais causas atribuídas ao assassinato de mulheres no Brasil em 2021 estão brigas domésticas, términos de relacionamento e ciúmes. Somadas, essas três causas representam quarenta e cinco por cento dos feminicídios no Brasil.

E outro dado alarmante: mais da metade dessas mulheres assassinadas são negras. O sexismo, no Brasil, se alia ao racismo.

O feminicídio, numa sociedade desigual como a nossa, se funda em grande parte nas desigualdades que atingem as mulheres. nós recebemos menos para realizar os mesmos serviços que os homens. Temos menos oportunidades de emprego. Ocupamos menos cargos de chefia tanto nas empresas quanto nos governos. Em todo país, uma única mulher foi eleita governadora em 2018, nossa professora Fátima Bezerra.

Temos também menores oportunidades educacionais. Somos forçadas à jornada tripla de trabalho: no emprego, na escola ou universidade e em casa.

O trabalho doméstico é essencial para a vitalidade da sociedade, contudo não é reconhecido nem remunerado, como bem salienta a teórica feminista norte-americana Nancy Fraser.

É por tudo isso que o feminicídio expressa uma realidade particular: a violência de gênero dirigida às mulheres. Não podemos silenciar. Não podemos esconder seu nome. Não podemos aceitar o ditado tão revelador que diz que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”. Se mete sim! E não é colher, é cadeia. É denúncia.

A luta de inúmeras gerações de feministas, como nossa heroica Nísia Floresta, proporcionou às mulheres de minha geração melhores condições de lutar por uma existência digna, pela preservação de nossas vidas e pela igualdade de gênero. É em nome de Nísia Floresta e tantas outras que digo: não nos calaremos. O feminicídio existe. Ele mancha a história de nosso país. Ele deve acabar. E para isso seguiremos denunciando e lutando.

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