Uma discussão sempre presente em períodos eleitorais, em especial nas eleições presidenciais é saber qual a influência da economia ou da situação econômico do país nas eleições. Certamente, é um fator relevante, no entanto, diversos estudos, baseados em pesquisas, têm mostrado que é preciso levar em conta diversos fatores que podem contribuir para o aumento ou perda de competitividade eleitoral. A economia é uma delas, mas não a única.

No cenário atual, antecedida por uma pandemia devastadora e do desmanche de políticas públicas, da desastrosa gestão do governo nas áreas de saúde, cultura, educação, meio ambiente, política externa etc., associada ao crescimento da inflação, congelamento de salários, anúncio de valor do salário mínimo que não repõe sequer a inflação anual, as despesas crescendo mais do que as receitas (e as perspectivas, com medidas eleitoreiras), as famílias se endividando e freando o consumo etc., tem impacto significativo, que se expressa na queda de popularidade do presidente, que tem caído sistematicamente. Em julho de 2021, segundo uma pesquisa do Datafolha feita entre os dias 7 e 8 de julho o presidente da República tinha 59% de rejeição, a maior desde o início do mandato (Um dados importante da pesquisa foi que revelou também que 70% consideravam que havia corrupção no governo, 63% que o presidente não tinha capacidade de liderar o país e também não confiavam nele). No começo do mandato, 67% dos brasileiros diziam confiar, e em julho de 2021, 68% dizem não confiar. Em 2022, os índices de rejeição (importantes para se analisar as chances eleitorais dos candidatos) continuam altos: uma pesquisa Datafolha realizada entre os dias 25 e 26 de maio de 2022, mostra que entre as mulheres a rejeição a Bolsonaro são de 60% para a classe mais baixa e de 56% para as duas classes mais altas. Em relação aos homens, a diferença entre classes é mais acentuada: tem 59% de rejeição entre quem recebe até dois salários mínimos, e 43% entre cinco salários ou mais.

Na eleição presidencial dos Estados Unidos em 1992, James Carvill o marqueteiro do então (ainda desconhecido governador de Arkansas, Bill Clinton), afirmou que o adversário de Clinton, George W. Bush perderia a eleição. Indagado sobre as razões da afirmativa, disse que um aspecto decisivo era a recessão que o país vivia e que isso tinha um impacto significativo no voto e usou uma frase que ficou famosa no marketing eleitoral: “É a economia, estúpido!”.

A relação entre eleições e economia tem sido objeto de muitos estudos. Uma questão relevante é: Qual a importância que os eleitores atribuem ao desempenho da economia no momento de votar? Um artigo muito citado, baseado em extensa pesquisa foi publicado na revista American Political Science Review(n. 65, p.131-43) por Gerard H. Kramer, intitulado Short Term Fluctuations in U.S. Voting Behavior. Nele, o autor sistematiza dados de uma pesquisa na qual analisou os resultados das eleições para a presidência dos Estados Unidos de 1896 a 1964 e argumentou que havia uma clara evidência da relação entre o desempenho da economia e os resultados eleitorais. Em eleições nas quais os presidentes tentam a reeleição, se tiver havido uma redução na renda per capita no mandato, por exemplo, se expressou em menos votos tanto do presidente como do seu partido no parlamento (senadores e deputados).

Daí a importância dos partidos e candidatos ter um programa econômico, que tenha como foco principal o crescimento e seus desdobramentos como aumento de oferta de emprego, diminuição da inflação, aumentos salariais etc. de forma que os candidatos (e partidos que o apóiam) possam receber o bônus eleitoral.

Em um artigo, baseado em pesquisas e revisão bibliográfica sobre o tema, G. Birgham Powell Jr e Guy D. Whitten publicaram na revista American Journal of political science (A cross-national analysis of economy voting: taking account of the political context n.37,1993, p.391-414) em que propõem um modelo de análise no qual procuram mostrar que os eleitores sancionem o governo pelo desempenho econômico, mas desde que identifiquem os seus responsáveis. Ter um bom desempenho e ser percebido pela população é de fundamental importância no processo eleitoral. Mas ao fazerem uma análise em 19 países (a maioria da Europa), afirmam que em alguns deles a responsabilidade pela situação econômica não é tão clara e atribuem influência a fatores institucionais e um dos argumentos é que o efeito da economia sobre o desempenho eleitoral, especialmente de candidatos a reeleição, é condicionado por uma variável que chamaram de clareza de responsabilidade (clarity of responsability) e que seu valor é maior em contextos nos quais o partido ao qual o presidente está filiado não depende de aliados e/ou da cooperação da oposição para governar. No caso do Brasil isso não ocorre, com o chamado presidencialismo de coalizão, no qual todos os presidentes eleitos pós ditadura militar (1964-1985) precisam de apoio de outros partidos para governar, e no caso atual basta considerar o papel central de partidos de direita e fisiológicos que apóiam o governo, e que são conhecidos como Centrão (embora o nome mais adequado seria Direitão).

No modelo proposto por Powell e Whitten, a responsabilidade pelo desempenho do governo é difusa porque sua base de sustentação é composta por vários partidos e assim pode não ficar claro para o eleitor quem deve ser responsabilizado pelo sucesso ou fracasso das políticas implementadas. No entanto, as pesquisas têm revelado que não é exatamente assim, sendo o presidente da República responsabilizado pelo fracasso (não apenas econômico, mas também social, político etc.,) do seu governo e que se expressa em altos índices de rejeição.

Mas há outros fatores que entram em jogo no processo eleitoral. Nas eleições de 2014 no Brasil, por exemplo, quando Dilma Rousseff venceu mais uma vez, havia um baixo crescimento do PIB e do superávit primário, e a inflação chegou a 6,75% e a taxa de desemprego era em torno de 5% (muito usado pela oposição na época mas ambos bem menores do que as respectivas taxas de hoje) mas em contraposição havia também programas sociais importantes como o Bolsa Família, com mais 14 milhões de famílias (e em torno de 56 milhões de pessoas) e outros como o Bolsa Pesca, beneficiando cerca de um milhão de pescadores, o Ciência Sem Fronteiras, que beneficiou milhares de jovens oriundos de famílias pobres para estudarem no exterior, Bolsa Atleta, Minha Casa Minha Vida, além de financiamento para pessoas de baixa renda para compra de móveis e eletrodomésticos e outros bens de consumo etc., Além disso, houve benefícios para aposentados, pensionistas, desempregados, deficientes (que foram reajustados com base no salário mínimo, e com valor superior à inflação), ou seja, são fatores importantes em um processo eleitoral e que não podem ser desconsiderados na intenção de voto.

A queda da popularidade é resultado de uma combinação de fatores, que tanto diz respeito à economia como o desemprego, alta da inflação etc., mas também do comportamento dos governantes, ou seja, não apenas suas palavras, como atos e, no caso do Brasil e do atual governo, podemos citar seu comportamento durante a pandemia, desde o início (não comprar vacinas quando poderia ter feito, as desconfianças em relação à sua eficácia, o não uso de máscaras e desestimular o distanciamento social, indicação de remédios sem eficácia, e que certamente teve influência em parcelas consideráveis da população para não se vacinarem etc) mas também contribuem para os desgastes e perda de popularidade, a distância entre o que diz e o que faz, as denúncias de corrupção, a adesão ao fisiologismo do Centrão, as críticas às instituições, como o Supremo Tribunal Federal, Tribunal Superior Eleitoral e em especial às urnas eletrônicas, com ameaças de não realização de eleições se não forem como ele quer (ou pretende) quando todas as pesquisas constatam, até o momento, que vai perder as eleições ( e ainda estimula diariamente os seus seguidores para não aceitarem a derrota previsível).

Uma das expectativas do governo para (tentar) reverter o quadro desfavorável em termos eleitorais é a retomada do crescimento econômico, o que é muito difícil. Alguns estudos apontam a tendência de aumento dos gastos públicos, em todos os governos, durante o período que antecede as eleições, com o objetivo de angariar votos, e no caso do Brasil, mesmo com a vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, (que criou restrições para aumento de gastos públicos e endividamento do Estado em anos de eleição).

No entanto, como distinguir entre despesas necessárias das que tem apenas motivação eleitoral? De qualquer forma, tem havido não investimentos nas áreas sociais, educação, cultura, saúde, meio ambiente etc., e sim cortes expressivo de gastos. Um decreto de 30 de maio de 2021 prevê um corte de R$ 8,2 bilhões do orçamento (em março já havia sido aprovado um corte de R$ 1,7 milhão, perfazendo assim um corte este ano de R$ 9,9 bilhões), com impactos significativos nos ministérios, como o da Educação, Saúde, Ciência e Tecnologia etc.. Mas, por que agora? Para viabilizar um aumento salarial de servidores públicos (a proposta do presidente é dar maiores aumentos para os setores da segurança pública) e embora com a justificativa de assegurar o cumprimento do teto de gastos, tem como objetivo principal (tentar) reverter os atuais índices de intenção de voto, ou seja, claramente com fins eleitorais.

Mas considerando baixas as perspectivas de crescimento econômico, mesmo com cortes e reajustes salariais (muito abaixo dos índices de inflação) é difícil reverter o quadro eleitoral, embora seja difícil prever o que ocorrerá, especialmente em se tratando de eleição, no qual entram outros fatores, além da economia, como conjunturais (na eleição de 2018 o atentado ao então candidato teve impacto significativo e certamente ajudou no aumento das intenções de voto).

Para o campo democrático e popular há grandes desafios nas eleições de 2022, como propor uma alternativa viável, um programa econômico consistente e não apenas como promessa eleitoral, que possa recuperar o protagonismo do Estado no sentido de criar empregos, controle da inflação, diminuição do desemprego, ampliação de programas de transferência de renda, aumento salarial e fundamentalmente a redução das desigualdades. E, importante como estratégia, mostrar à população que existem alternativas como foi feito nos governos Lula e no primeiro governo de Dilma Rousseff, com políticas sociais que levaram milhões de brasileiros a saíram da situação de miséria, diminuição da pobreza, evidenciando que isso é possível.

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